29 de abril de 2009

As Namoradeiras de Minas

Por: Bruno Nascimento Campos

É curioso como o preconceito contra as minorias aflora de forma tão espontânea, consensual e sutil aqui nas nossas Minas Gerais. Muitos dos que lerem estas palavras poderão chamar-me leviano, ou mesmo de fora da realidade, mas vejo as “namoradeiras” como exemplos cabais disto. Elas são bonecas de gesso ou madeira que ficam normalmente nas janelas de casas como que à espera do “príncipe encantado” que nunca chegará. 
As “namoradeiras” materializam o preconceito contra mulheres e, principalmente, contra as negras e mulatas. Quase ninguém percebe, mas está presente. Alguém já parou para reparar? Essas bonecas são, com raríssimas exceções, mulatas ou negras, com vestidos muito coloridos e decotados. Dentro da tradição mineira, marcada fortemente pelo machismo, as mulheres que ficam nas janelas estão ou a procura de homem ou de notícias fresquinhas para fofocar. 
Por que negras ou mulatas? Isto é reflexo da mais pura forma de racismo, aquele que considera indígenas, negros, mulatos e mulheres como seres inferiores. Desdobramento daquelas teorias eugênicas de fins do século XIX, mas que ainda estão fortemente arraigadas no senso comum de nossa população. 
O Brasil, em especial o Rio de Janeiro, divulga a imagem no exterior como a terra do carnaval e do futebol. No Carnaval é vendido o estereótipo da “mulher brasileira”, a mulata seminua: “produto exótico tipo exportação”. A maior parte dos jogadores de futebol são negros ou mulatos. São as formas mais comuns apregoadas pela mídia em geral de ascendência econômica e social para pobres no Brasil, em especial de negros e mulatos, homens ou mulheres. Mas onde, na realidade, muito poucos conseguem se destacar. Para os homens, basta exercer bem as artes da bola. Para as mulheres a realidade é ainda mais perversa: sua capacidade de ascensão se limita à exibição de suas belas formas, elas não precisam e nem devem mostrar habilidades manuais ou intelectuais. 
Nas Minas Gerais, há a divulgação do patrimônio histórico, da religiosidade e do profano. Mas apesar disso, há também a divulgação de estereótipos femininos. As mineiríssimas “namoradeiras” se tornaram uma atração entre os turistas estrangeiros que as vêem como um cartão de visita brasileiro. Esses turistas levam uma imagem distorcida da mulher mineira na bagagem para seus países de origem: novamente a mulata ou a negra como “produto exótico para exportação”. Aqui elas não estão seminuas na passarela do samba, mas nas janelas. Ingênuas, belas e insinuantes, com os fartos seios bem marcados e decote saliente à espera do homem perfeito. 
As mulheres pobres, em sua maioria negras ou mulatas, seriam, dentro da ótica acima, levadas a se colocar na vitrine para encontrar seu “príncipe encantado”, ao passo que as mais abastadas não precisam estar na janela se insinuando para ninguém. Reparem que as “namoradeiras” raríssimas vezes são brancas.

Pense nisso, nossos preconceitos podem aparecer nas nossas ações mais simples e cotidianas...

Publicado originalmente em O Grande Matosinhos.

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